Janio de Freitas
A causa esquecida
DE SÃO PAULOEntre os vários motivos que provocaram quase 40 horas de discussão e votação em apenas dois dias na Câmara, o mais autêntico não foi lembrado.
Por fim aprovada ali e, em seguida, no Senado, a medida provisória 595 levou ao Congresso, e aos grandes interesses empresariais, inovações que modificam estrutural e economicamente todo o sistema portuário brasileiro. Inovações -eis o problema.
Propostas de reformas levam sempre ao mesmo. Ou, nos pouquíssimos casos de aprovação, exigem batalhas ferozes no Congresso, com o choque dos interesses econômicos que mobilizam e dividem os parlamentares acima dos partidos, ou ficam como inovações de reconhecida necessidade, mas sem condições de efetivação.
É a predominância histórica do reacionarismo diante de toda inovação econômica e estrutural proposta no Brasil. Foi isso mesmo que se deu outra vez: a reação à mudança, pelos interesses financeiros beneficiados no sistema portuário vigente, com os seus centuriões de ocasião no Congresso.
Não se trata de realidade exclusiva do Brasil. Viu-se há pouco a batalha no Congresso americano, tão semelhante às dos parlamentares brasileiros, quando Barack Obama propôs uma reforma até tímida do sistema de saúde americano, para dotá-lo de uma extensão pública. Viu-se o mesmo com intenções de François Hollande na França. Lá e cá, é o poder econômico em ação, que é também poder social.
A diferença é que o Brasil precisa muito mais de reformas. E aqui é muito mais difícil fazê-las. Nos casos incomuns em que o poder econômico se divide entre duas ou mais linhas de interesse, abre-se alguma possibilidade de reforma. Desde que limitada, para preservação dos interesses aparentemente vencidos.
Faz 125 anos que é assim. Desde a abolição da escravatura.
Faz 125 anos que é assim. Desde a abolição da escravatura.
OS AUTORES
O Senado proclama-se decidido a não mais aceitar que a Câmara, depois de esbanjar todo o tempo de tramitação dado às medidas provisórias, ponha os senadores em correria para votar nas últimas horas do prazo.
O problema é real. Mas foi criado pelo Senado. As regras de tramitação de medida provisória foram aprovadas lá, sem a determinação de tempo para sua passagem pela Câmara. E seria preciso prazo delimitado também para o Senado, que pode emendar o texto recebido e assim fazê-lo voltar à Câmara. Logo, seria necessário prever a possível segunda tramitação na Câmara.
Tudo o que se refere às medidas provisórias é uma bagunça que completa 25 anos.
A ARMA
Lula na Argentina, sobre os meios de comunicação: "Quando nós os criticamos, eles dizem que estão sendo atacados. Quando nos atacam, falam em democracia".
Pegou em cheio a sabedoria criada pela imprensa, e depois estendida ao rádio e à TV. No Brasil, com um aprimoramento: se um jornal falasse do outro, ou uma rádio da outra, todos se tornariam vulneráveis, logo é da "ética dos meios de comunicação" a moita mútua.
Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno "Poder" aos domingos, terças e quintas-feiras.
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