Aperfeiçoando o marco regulatório da energia elétrica
Publicado em O Liberal, 09/09/12
Cláudio Puty (*)
Volto a falar da CELPA, desta vez não como consumidor lesado pelas constantes quedas de energia e perda de uma TV queimada, mas de um aspecto importante da regulação do setor.
Semana passada vimos mais um capítulo do imbróglio aparentemente sem fim que se tornou o caso CELPA. Às vésperas de uma assembléia que acabou aprovando um plano de pagamento de dívidas de seus credores, não havia acordo entre os dois Ministérios Públicos, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e a Equatorial, empresa interessada em assumir as operações de nossa concessionária de energia elétrica. Um dos nós era o pedido da Equatorial que alguns direitos legalmente estabelecidos dos consumidores paraenses fossem “temporariamente” flexibilizados como pré-condição à compra, o que tanto o Ministério Público Estadual quanto o Federal refutaram de imediato. Da sua parte, a ANEEL suspendeu, também na véspera da assembléia de credores, a reunião que apreciaria e aprovaria o Plano de Transição da CELPA, condição necessária para a sua própria validade. O motivo não declarado: a edição de uma Medida Provisória, a MP577, que tenta corrigir problemas de regulação do setor elétrico brasileiro, particularmente os associados aos casos de recuperação judicial e falência de suas distribuidoras.
A edição da MP 577, mesmo tardia, objetiva evitar que se repitam casos como o da Celpa em outros estados brasileiros. Antes tarde do que nunca: trata-se de solucionar problemas decorrentes do modelo de privatização adotado pelos governos tucanos, em que as atividades das concessionárias como a Celpa respondem mais às suas conveniências do que aos interesses dos cidadãos e consumidores. O Pará é um exemplo gritante dos limites desse modelo.
A Constituição Federal determina competência da União na regulação e exploração dos serviços públicos de energia elétrica, diretamente ou via concessões e permissões. Entretanto, em casos de recuperação judicial e falência das concessionárias antes da publicação da MP577, aplicava-se a Lei de Falências (11.101/05), o que gerava um conflito de competências entre instâncias federativas, já que esta determinava a justiça estadual como foro competente para promover todo o processo de recuperação judicial. No caso das concessionárias federais, essa legislação carecia de especificidade.
Com a Medida Provisória, o governo objetiva transformar uma série de normas da ANEEL em lei e, se for aprovada pelo Congresso Nacional após cuidadosa avaliação, permitirá à Agência declarar a intervenção, nomear o interventor e promover o processo administrativo para apurar responsabilidades pelos fatos que motivaram a intervenção. O interventor disporá de plenos poderes para proceder a gestão dos ativos e das operações da empresa, mantida a obrigação de prestar contas dos seus atos à agência reguladora. O prazo limite da intervenção será de um ano, admitida a prorrogação.
Em caso de intervenção, caberá ao próprio poder concedente a prestação temporária de serviço, mediante órgão ou entidade da administração pública federal, até que um novo concessionário seja selecionado por processo licitatório e contratado. O prestador temporário dos serviços observará os contratos firmados pelo titular da concessão extinta, de modo a garantir segurança jurídica no âmbito do setor elétrico, mas não responderá pelos diretos e obrigações relacionados ao titular da concessão extinta, de modo a evitar a transferência de ônus – assumido pela empresa privada que exercia a concessão – para a unidade que prestará temporariamente o serviço.
Aos acionistas da concessionária sob intervenção é assegurado o direito de, num prazo de 60 dias, apresentar à ANEEL um plano de correção e recuperação de falhas. Em caso de aprovação do plano haverá o encerramento da intervenção.
Acredito que a MP577 contribui para promover o aperfeiçoamento do marco regulatório do setor elétrico e, ao mesmo tempo, explicita impassses importantes na distribuição de energia no Brasil, já que sua publicação permitiu a intervenção em oito concessionárias do grupo Rede, impedindo que seguissem o mesmo caminho da CELPA. Assim, o Estado reassume seu papel de regulador de um setor onde os riscos de condutas abusivas por parte das concessionárias têm sido bem mais freqüentes que o razoável.
(*) Deputado Federal (PT-PA).
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