Na semana que vem, teremos a cúpula dos líderes do G-20 em Cannes. A crise econômica, com epicentro na área do euro, confere uma importância especial ao encontro. É uma oportunidade que o G-20 não deveria desperdiçar. Será um fiasco se os líderes se reunirem para aprovar trivialidades, reiterar boas intenções e repetir generalidades, saindo de Cannes sem oferecer uma resposta à crise.
Depois de demoradas e difíceis negociações, os líderes da União Européia, em especial os da área do euro, aprovaram uma abordagem mais abrangente para a sua crise. Falta muita especificação, não está inteiramente claro se as propostas aprovadas são consistentes e suficientes e nem se têm o apoio necessário para serem aplicadas com sucesso. Em todo caso, parece inegável que os europeus deram passos importantes.
A questão que se coloca para os líderes não europeus em Cannes é basicamente como responder ao programa apresentado pelos europeus. A Europa já começou a pedir apoio financeiro ao resto do mundo. A China com suas imensas reservas internacionais é um dos principais alvos; outros países, inclusive os demais Brics, também vêm recebendo apelos.
Essa discussão começou na reunião anual do FMI em Washington em setembro e prosseguiu na reunião ministerial do G-20 de Paris em outubro. Em Washington, os Brics indicaram disposição de aportar recursos adicionais, se necessário, por intermédio do FMI e outras organizações. Em Paris, o ministro da Fazenda do Brasil apresentou às suas contrapartes do G-20 uma proposta específica e as precondições para que ela pudesse se efetivar. O documento foi distribuído à imprensa, mas teve pouca repercussão.
Abro um pequeno parêntese. Tudo vaza, absolutamente tudo – menos o que é distribuído à imprensa. Melhor teria sido simular um “vazamento” para um ou outro jornalista competente ou fazer misteriosas declarações “off the record”. Mas, enfim, fecho o parêntese.
Como a proposta brasileira repercutiu pouco, vou explicá-la em poucas palavras. Para fazer face a um cenário extremo, de agravamento dramático da crise, o G-20 concordaria em apoiar a criação de uma retaguarda forte, ampliando substancialmente a capacidade de empréstimo do FMI. No entender do Brasil, o caminho mais rápido e eficiente é pedir à diretoria do FMI que defina e aprove, antes do fim do ano, um arcabouço comum dentro do qual países dispostos a fazê-lo assinariam acordos bilaterais de empréstimo ao FMI, a exemplo do que foi feito em 2009.
Essa proposta foi elaborada e definida em detalhe pelas equipes brasileiras, sob orientação do ministro da Fazenda. Admitindo-se que haja um mínimo de coordenação e solidariedade entre os integrantes do G-20, acredito que seria possível formulá-la de maneira que ela possa mobilizar uma soma muito considerável de recursos em prazo curto.
Evidentemente, tudo isso faz parte de um jogo de xadrez. Há muita casca de banana e até risco de facadas nas costas. É preciso por isso explicitar claramente as condições que levariam países como o Brasil a ajudar a articular e eventualmente participar de uma iniciativa desse tipo. Entre elas, estariam as seguintes:
Qualquer contribuição adicional ao FMI deve ser definida como de duração curta e como ponte para a próxima revisão de quotas, cuja conclusão deve ocorrer até janeiro de 2014. Essa reforma permitirá reequilibrar a distribuição do poder decisório no FMI.
Deve haver o compromisso firme de implementar plenamente e nos prazos previstos a reforma de quotas e governanças de 2010. Os europeus e alguns outros países estão mostrando, digamos, pouco entusiasmo em levar adiante o acordo de 2010. O FMI só lançaria mão dos novos bilaterais como última linha de defesa, em caso de risco de esgotamento dos seus recursos atuais. Os recursos estariam disponíveis para qualquer país-membro que precisasse de apoio financeiro do FMI – não apenas para os europeus -, de acordo com as regras da instituição e com condicionalidades apropriadas.
Se essas e outras condições forem objeto de acordo, seria possível, acredito, dar passos importantes em Cannes, confirmando a importância do G-20 como principal foro para cooperação econômica internacional. Veremos.
Por: Paulo Nogueira Batista Jr.
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