Publicado em Jornal O Liberal - Poder - 18/08/2013
Deputado Federal Puty
A Anistia Internacional lançou, na semana passada, uma campanha para exigir das autoridades brasileiras uma solução para o desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, que não é visto desde o último dia 14 de julho, quando estava sob custódia da polícia em uma favela carioca. Dez dias depois do desaparecimento de Amarildo, a 2.646 quilômetros do Rio de Janeiro, no município de São Félix do Xingu, o tratorista Welbert Cabral Costa, de 26 anos, teria sido assassinado no interior da fazenda Vale do Triunfo, pertencente ao Grupo Santa Bárbara. Welbert tinha mulher e quatro filhos pequenos.
Denúncia da Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Pará e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) diz que uma testemunha presenciou um empregado da fazenda disparar um tiro na nuca do tratorista. O motivo para esse crime bárbaro seria um desentendimento envolvendo direitos trabalhistas. Welbert voltara ao local onde trabalhara para reclamar R$ 18 mil, referentes ao período de licença em razão de um acidente. Foi morto, friamente, nos moldes de uma execução extrajudicial. Até agora seu corpo não foi encontrado.
A violência que se abateu sobre Welbert é reveladora do cenário de cangaço que domina o campo brasileiro e que vem crescendo num ritmo “amazônico” em razão do modelo concentrador do agronegócio – que a CPT denomina “neocolonialismo” – que ali se impôs desde a época da ditadura. Esse modelo avança sobre novas áreas, sobretudo no Estado do Pará, num ritmo de “acumulação primitiva de capital”, como Marx definia os primórdios selvagens do capitalismo em expansão.
O relatório Conflitos no Campo Brasil em 2012, da CPT, traça um quadro preciso das consequências do avanço deste modelo. O estudo aponta que, entre 1996 e 2010, 799 trabalhadores rurais foram presos, 809 foram ameaçados de morte e 231 assassinados, só no Estado do Pará. Nesse mesmo período, 31.519 famílias foram despejadas ou expulsas de 459 áreas que eram reivindicadas para assentamentos da reforma agrária no Estado. Um verdadeiro caso de “limpeza social”, a moderna versão do higienismo. Segundo a CPT, no ano passado, havia 130 fazendas ocupadas por 25 mil famílias de trabalhadores rurais sem-terra na região, envolvendo disputa de mais de um milhão de hectares.
Avançando um pouco mais, o relatório crava que os conflitos pela posse de terra apresentam uma tendência de crescimento nos últimos cinco anos em todo o país. Em 2008 registrou-se o menor número de disputas em uma década (751), mas, no ano seguinte, este número passou para 854. Já em 2010 o número de casos ficou estável (853), mas em 2011, no entanto, cresceu para 1.035 e avançou para 1.067 em 2012 – um aumento de 3,1%.
Estes 1.067 conflitos se referem a ações de resistência e enfrentamento pelo acesso, posse, uso e propriedade da terra, envolvendo diferentes categorias de camponeses e povos indígenas. Uma leitura dos números revela que, ao avançar sobre o patrimônio natural, o capital não poupa nada, ocupando territórios indígenas, quilombolas e de outras comunidades tradicionais. Tudo vai sendo engolido pela lógica implacável do capital.
O dado mais revelador está no contingente de famílias vítimas de pistolagem. Esse número subiu de 15.456, em 2011, para 19.968, em 2012 – um aumento de cerca de 30%. Pará, Maranhão e Paraíba são os Estados que lideram o ranking nesta categoria de violência. Quando apuramos a análise por regiões geoeconômicas, vemos que a Amazônia é onde se concentra o maior número de conflitos, 489 dos 1.067 – o que corresponde a 45,8% do total. Ficam também na Amazônia 97% das áreas envolvidas nos conflitos. No Nordeste são 329 e no Centro-Sul, 249. Isso mostra claramente a capacidade de poderosos grupos econômicos de ameaçar trabalhadores, indígenas, quilombolas e sindicalistas.
A fazenda onde Welbert desapareceu pertence à Agropecuária Santa Bárbara Xinguara, empresa que tem o grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, entre os sócios. O grupo, um dos maiores criadores de gado do mundo, está desde 2005 no Sul do Pará e tem cinco unidades de produção, com capacidade superior a 500 mil animais, distribuídos em 500 mil hectares de terra.
Ironicamente, a entrada da fazenda fica a cerca de 40 quilômetros da curva do “S” da rodovia PA-150, local onde 19 trabalhadores rurais sem-terra foram assassinados em 17 de abril de 1996, no chamado Massacre de Eldorado dos Carajás, em razão da ação violenta da Polícia Militar para desbloquear a rodovia. Um simbolismo trágico da permanência da violência e da impunidade dos crimes contra os trabalhadores do campo.
Deputado Federal Puty
A Anistia Internacional lançou, na semana passada, uma campanha para exigir das autoridades brasileiras uma solução para o desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, que não é visto desde o último dia 14 de julho, quando estava sob custódia da polícia em uma favela carioca. Dez dias depois do desaparecimento de Amarildo, a 2.646 quilômetros do Rio de Janeiro, no município de São Félix do Xingu, o tratorista Welbert Cabral Costa, de 26 anos, teria sido assassinado no interior da fazenda Vale do Triunfo, pertencente ao Grupo Santa Bárbara. Welbert tinha mulher e quatro filhos pequenos.
Denúncia da Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Pará e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) diz que uma testemunha presenciou um empregado da fazenda disparar um tiro na nuca do tratorista. O motivo para esse crime bárbaro seria um desentendimento envolvendo direitos trabalhistas. Welbert voltara ao local onde trabalhara para reclamar R$ 18 mil, referentes ao período de licença em razão de um acidente. Foi morto, friamente, nos moldes de uma execução extrajudicial. Até agora seu corpo não foi encontrado.
A violência que se abateu sobre Welbert é reveladora do cenário de cangaço que domina o campo brasileiro e que vem crescendo num ritmo “amazônico” em razão do modelo concentrador do agronegócio – que a CPT denomina “neocolonialismo” – que ali se impôs desde a época da ditadura. Esse modelo avança sobre novas áreas, sobretudo no Estado do Pará, num ritmo de “acumulação primitiva de capital”, como Marx definia os primórdios selvagens do capitalismo em expansão.
O relatório Conflitos no Campo Brasil em 2012, da CPT, traça um quadro preciso das consequências do avanço deste modelo. O estudo aponta que, entre 1996 e 2010, 799 trabalhadores rurais foram presos, 809 foram ameaçados de morte e 231 assassinados, só no Estado do Pará. Nesse mesmo período, 31.519 famílias foram despejadas ou expulsas de 459 áreas que eram reivindicadas para assentamentos da reforma agrária no Estado. Um verdadeiro caso de “limpeza social”, a moderna versão do higienismo. Segundo a CPT, no ano passado, havia 130 fazendas ocupadas por 25 mil famílias de trabalhadores rurais sem-terra na região, envolvendo disputa de mais de um milhão de hectares.
Avançando um pouco mais, o relatório crava que os conflitos pela posse de terra apresentam uma tendência de crescimento nos últimos cinco anos em todo o país. Em 2008 registrou-se o menor número de disputas em uma década (751), mas, no ano seguinte, este número passou para 854. Já em 2010 o número de casos ficou estável (853), mas em 2011, no entanto, cresceu para 1.035 e avançou para 1.067 em 2012 – um aumento de 3,1%.
Estes 1.067 conflitos se referem a ações de resistência e enfrentamento pelo acesso, posse, uso e propriedade da terra, envolvendo diferentes categorias de camponeses e povos indígenas. Uma leitura dos números revela que, ao avançar sobre o patrimônio natural, o capital não poupa nada, ocupando territórios indígenas, quilombolas e de outras comunidades tradicionais. Tudo vai sendo engolido pela lógica implacável do capital.
O dado mais revelador está no contingente de famílias vítimas de pistolagem. Esse número subiu de 15.456, em 2011, para 19.968, em 2012 – um aumento de cerca de 30%. Pará, Maranhão e Paraíba são os Estados que lideram o ranking nesta categoria de violência. Quando apuramos a análise por regiões geoeconômicas, vemos que a Amazônia é onde se concentra o maior número de conflitos, 489 dos 1.067 – o que corresponde a 45,8% do total. Ficam também na Amazônia 97% das áreas envolvidas nos conflitos. No Nordeste são 329 e no Centro-Sul, 249. Isso mostra claramente a capacidade de poderosos grupos econômicos de ameaçar trabalhadores, indígenas, quilombolas e sindicalistas.
A fazenda onde Welbert desapareceu pertence à Agropecuária Santa Bárbara Xinguara, empresa que tem o grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, entre os sócios. O grupo, um dos maiores criadores de gado do mundo, está desde 2005 no Sul do Pará e tem cinco unidades de produção, com capacidade superior a 500 mil animais, distribuídos em 500 mil hectares de terra.
Ironicamente, a entrada da fazenda fica a cerca de 40 quilômetros da curva do “S” da rodovia PA-150, local onde 19 trabalhadores rurais sem-terra foram assassinados em 17 de abril de 1996, no chamado Massacre de Eldorado dos Carajás, em razão da ação violenta da Polícia Militar para desbloquear a rodovia. Um simbolismo trágico da permanência da violência e da impunidade dos crimes contra os trabalhadores do campo.
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